Saúde • 10:03h • 28 de outubro de 2025
Sociedade civil busca reparação e amparo para órfãos da covid-19
Associação de familiares de vítimas cobra política nacional
Jornalista: Carolina Javera MTb 37.921 com informações de Agência Brasil | Foto: Alex Pazuello/Semcom/Prefeitura de Manaus
Em 2021, a assistente social Paola Falceta perdeu a mãe para a covid-19 e transformou o luto em ação. Ao lado de um amigo, fundou a Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico), para cobrar justiça pelas mortes que poderiam ter sido evitadas. Desde o início, ela se preocupou especialmente com crianças e adolescentes que dependiam dos familiares que morreram.
“Penso muito nas crianças que tinham pai informal, trabalho precarizado ou que eram criadas pelas avós. Elas não têm voz, não dão entrevista, e acabam invisíveis”, diz Paola, que hoje é vice-presidente da Avico.
Um estudo recente estima que cerca de 284 mil crianças e adolescentes perderam pai, mãe ou outro cuidador responsável durante os anos críticos da pandemia, entre 2020 e 2021.
Apesar dos números, não existe uma política nacional para apoiar esses órfãos. O Ceará é uma das poucas exceções, com auxílio mensal de R$ 500 para quem perdeu pai ou mãe pela doença. No governo federal, propostas ainda tramitam lentamente.
No Senado, o PL 2.180/2021 cria um fundo e programa de amparo para órfãos da covid-19, mas segue parado nas comissões. O Ministério dos Direitos Humanos discute medidas desde 2023, sem avanços.
A Avico tem atuado na Justiça. Em 2021, entrou com ação pedindo responsabilização do então presidente Jair Bolsonaro pela condução da pandemia. O caso foi arquivado, mas trouxe visibilidade ao movimento. A principal esperança agora é uma ação civil pública do Ministério Público Federal que pede indenizações mínimas de R$ 100 mil às famílias das vítimas e R$ 50 mil para sobreviventes com sequelas graves, além de R$ 1 bilhão em reparação coletiva.
Segundo Paola, a associação reuniu 139 familiares como testemunhas e colaborou com estudos científicos que embasam o processo.
Responsabilidade do Estado
O pedagogo Milton Alves Santos, coordenador da Coalizão Orfandade e Direitos, reforça a necessidade de reparação. Ele defende que o Estado seja responsabilizado pelos danos ao desenvolvimento dessas crianças.
Além das dificuldades financeiras, Milton destaca os impactos emocionais. “Muitos não puderam se despedir do pai ou da mãe. Precisam de apoio psicológico para um luto saudável”, afirma.
Medidas de menor custo também poderiam fazer diferença imediata, como uma norma nacional para que as redes de educação, assistência e saúde identifiquem e priorizem crianças órfãs da covid-19.
Histórias por trás dos números
Entre esses órfãos está Bento, de 8 anos. O pai, Claudio da Silva, morreu em 2021. A pensão por morte ajuda a mãe, Ana Lúcia Lopes, a manter a casa, mas a saudade permanece.
“Penso nele todos os dias. O Claudio ia se orgulhar de ver o Bento no judô, na natação. Ele era alegre, gostava de viajar. Sinto muita falta disso”, diz.
Ana também cobra reparação. “É revoltante pensar que ele não teve a chance de se vacinar. Meses depois da morte dele, vimos notícias de vacinas oferecidas ao governo e ignoradas.”
Para Milton, garantir direitos a esses órfãos é também preservar a memória das vítimas. “Sem memória, não há justiça”, afirma.
Paola garante que continuará lutando: “Se nada avançar aqui, vamos ao Tribunal Penal Internacional. A história da Maria da Penha mostra que é possível.”
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