Variedades • 17:40h • 05 de maio de 2025
Há 100 anos, Albert Einstein chegava ao Brasil em visita científica
Pesquisador buscava divulgar Teoria da Relatividade, recém comprovada
Da Redação com informações de Agência Brasil | Foto: J. Pinto/Instituto Oswaldo Cruz

Há exatamente 100 anos, Albert Einstein desembarcava no Rio de Janeiro para a sua única estadia em solo brasileiro. Em seu diário de viagem, registrou a impressão da chegada em 4 de maio de 1925:
"Chegada ao Rio ao pôr do sol, com clima esplêndido. Em primeiro plano, ilhas de granito de formato fantástico. A umidade produz um efeito misterioso."
Einstein já havia feito uma breve parada no Brasil semanas antes, em 21 de março, durante escala do navio rumo à Argentina. Mas sua estadia de fato só ocorreu após uma jornada de um mês e meio pela América do Sul, que incluiu visitas a Buenos Aires e Montevidéu.
A viagem tinha como foco divulgar a recém-comprovada Teoria da Relatividade e fortalecer laços com comunidades judaicas e alemãs — num contexto de crescimento do Partido Nazista na Europa. Organizações judaicas financiaram a missão, com apoio de instituições científicas.
Exemplar da revista Annalen der Physik assinado por Albert Einstein que encontra-se sob a guarda da Biblioteca de Manguinhos, na Fiocruz, no Rio de Janeiro.Tomaz Silva/Agência Brasil
Durante os sete dias no Rio, então capital do Brasil, Einstein visitou instituições como a Fundação Oswaldo Cruz, o Museu Nacional e o Observatório Nacional. Também realizou duas palestras públicas: uma na Academia Brasileira de Ciências e outra no Clube de Engenharia. Segundo o historiador Alfredo Tolmasquim, do Museu de Astronomia e Ciências Afins (Mast), a presença de Einstein foi um impulso simbólico importante para o desenvolvimento das chamadas "ciências puras" no país.
“O Brasil vivia ainda sob forte influência do positivismo, que priorizava o uso prático da ciência. A vinda de Einstein ajudou a valorizar a pesquisa básica, algo ainda incipiente por aqui”, explica o pesquisador.
Na época, o país contava com apenas uma universidade — formada pela junção de escolas de engenharia, medicina e direito — e poucos pesquisadores atuavam com física teórica.
Interesses além da física
Diante dessa realidade, Einstein se mostrou curioso por outros campos. Encantou-se, por exemplo, com o trabalho do psiquiatra Juliano Moreira, que defendia o tratamento humanizado de pessoas com transtornos mentais e combatia ideias racistas associadas à mestiçagem. A convite de Moreira, Einstein visitou o manicômio dirigido por ele e conheceu as oficinas terapêuticas implementadas no local.
Outro destaque foi seu interesse pela popularização da ciência. Ele conheceu a Rádio Sociedade — atual Rádio MEC — fundada em 1922 para difundir conhecimento científico, e fez até uma transmissão ao vivo. “Fiquei admirado com os frutos que a ciência, aliada à tecnologia, pode levar até os lugares mais isolados”, declarou.
A dívida da ciência com o Brasil
A visita também foi oportunidade para Einstein conhecer cientistas envolvidos na comprovação da Teoria da Relatividade. Em 1919, uma expedição liderada pelo diretor do Observatório Nacional, Henrique Morize, observou o eclipse solar em Sobral, no Ceará, e ajudou a comprovar o desvio da luz previsto pela teoria.
Ao visitar o Observatório, Einstein conheceu Morize e declarou:
“O problema que minha mente imaginou foi resolvido aqui, no céu do Brasil.”
O físico Jailson Alcaniz, atual diretor do Observatório, destaca que a contribuição brasileira foi essencial. Ele relembra que a preparação começou em 1912, quando o astrônomo Charles Perrine, da Argentina, tentou testar a teoria em um eclipse em Minas Gerais, mas foi frustrado pela chuva. Em seguida, uniu-se a Morize para organizar a observação em Sobral, com sucesso.
“O experimento de Sobral foi a primeira evidência observacional da relatividade geral e mudou os rumos da física. Sem Morize e Perrine, nada disso teria acontecido em 1919.”
Ainda assim, por décadas a façanha foi atribuída principalmente à expedição britânica liderada por Arthur Eddington, que estava na Ilha de Príncipe (África) e obteve dados menos precisos. “Isso mostra como a ciência eurocêntrica muitas vezes apaga contribuições de outros países”, afirma Alcaniz.
Contradições e preconceitos
Apesar do reconhecimento formal aos cientistas brasileiros, os registros íntimos de Einstein revelam visões marcadas por preconceitos culturais. Em seu diário, escreveu frases que demonstram impaciência com os hábitos locais e chegou a atribuir ao clima tropical o que via como “tolice” nos discursos de boas-vindas.
Em um trecho controverso, afirmou:
"Aqui sou uma espécie de elefante branco para eles, e eles são macacos para mim."
Segundo Tolmasquim, que traduziu os diários em seu livro Einstein: o viajante da relatividade na América do Sul (2011), o termo usado em alemão na época tinha conotação mais próxima de “ingenuidade” do que de racismo direto. Ainda assim, Einstein usou expressões que refletem uma visão europeia de superioridade.
Curiosamente, também demonstrou encanto pela diversidade brasileira:
"A miscelânea de povos nas ruas é deliciosa: Portugueses, índios, negros e tudo no meio, de modo vegetal e instintivo, dominado pelo calor."
O físico ficou tão impressionado com o general Cândido Rondon que escreveu uma carta ao comitê do Nobel da Paz, sugerindo sua indicação por incorporar tribos indígenas à sociedade “sem uso da força”.
Tolmasquim resume:
“Ele estava cansado, frustrado por não encontrar pares à altura para discutir física. A viagem foi longa, e os discursos solenes o entediavam. Sentiu que havia perdido tempo.”
Sua última frase antes de deixar o Brasil, no dia 12 de maio, ilustra esse cansaço:
"Longos discursos com muito entusiasmo e excessiva adulação, mas sinceros. Graças a Deus acabou. Finalmente livre, mas mais morto que vivo."
O Museu de Astronomia fez exposição para comemorar o centenário da comprovação da teoria da relatividade geral de Albert Einstein em 2019 Foto de Arquivo/Tomaz Silva/Agência Brasil
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