Responsabilidade Social • 16:40h • 09 de junho de 2025
Cimento com fibras vegetais da USP é mais durável e ecológico
Produção de cimento usa composto que "captura" dióxido de carbono, gás do efeito estufa; meta é auxiliar a reduzir as emissões da produção de etanol
Jornalista: Carolina Javera MTb 37.921 com informações de Agência SP | Foto: Cedida pelo pesquisador Adriano Galvão de Souza Azevedo

Pesquisadores da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, em Pirassununga, desenvolveram um novo tipo de cimento com fibras vegetais, capaz de absorver 100 quilos de dióxido de carbono por metro cúbico. O novo ligante substitui compostos à base de carbonato de cálcio por óxido de magnésio, incorporando o dióxido de carbono – um dos gases de efeito estufa – ao material e obtendo um cimento mais resistente e durável.
A ideia da pesquisa é utilizar o dióxido de carbono gerado durante a produção de etanol de cana-de-açúcar, ajudando a reduzir as emissões desse poluente, estimadas em 11,3 milhões de toneladas apenas no Estado de São Paulo. Os resultados dos testes foram publicados na revista científica Construction and Building Materials.
“A produção de cada tonelada de etanol gera aproximadamente 956,5 kg de dióxido de carbono. Contudo, o carbono presente no etanol tem origem vegetal, principalmente da cana-de-açúcar, e é capturado da atmosfera pela fotossíntese”, explica o químico Adriano Azevedo, pesquisador da FZEA. “Assim, parte das emissões industriais de dióxido de carbono e todo o gás liberado na combustão do etanol pode ser compensado pelo crescimento da biomassa. Em um ciclo ideal, as emissões líquidas seriam próximas de zero, fazendo do etanol um biocombustível de baixo carbono.”
Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), São Paulo foi, em 2020, o maior produtor de etanol do país, com 14,7 milhões de metros cúbicos, cerca de 45% da produção nacional. Das 360 usinas autorizadas, 149 estão no estado, com capacidade instalada de 169,4 mil m³/dia. “Essa produção resulta na emissão anual de aproximadamente 11,3 milhões de toneladas de dióxido de carbono”, afirma Azevedo. “Desenvolver tecnologias para reaproveitamento e captura desse gás pode ser decisivo para descarbonizar a matriz energética nacional.”
De acordo com o pesquisador, o novo cimento difere do tipo Portland tradicional por utilizar óxido de magnésio em vez de compostos de cálcio. “O cimento Portland tem pH elevado, entre 12,5 e 13, o que acelera a degradação das fibras vegetais. Já os cimentos com óxido de magnésio possuem pH mais moderado, entre 10 e 10,5, reduzindo o ataque alcalino às fibras e preservando suas propriedades estruturais por mais tempo.”
Captura de dióxido de carbono
“Além disso, o processo de cura adotado envolve carbonatação acelerada, que captura dióxido de carbono e reduz ainda mais o pH do material”, explica Azevedo. “Essa menor alcalinidade favorece a conservação das fibras vegetais e melhora a ecoeficiência do compósito.”
A captura de dióxido de carbono ocorre por meio da reação entre espécies alcalinas presentes na matriz cimentícia e o ácido carbônico, formado quando o dióxido de carbono se dissolve na água. No caso dos cimentos com óxido de magnésio, forma-se principalmente hidróxido de magnésio, conhecido como brucita. Os produtos de carbonatação incluem carbonato de magnésio anidro, além de formas hidratadas como nesquehonita, hidromagnesita e dypingita, dependendo da temperatura, umidade e concentração de dióxido de carbono.
“Esses compostos preenchem os poros do material, aumentando sua densidade, reduzindo a absorção de água e melhorando as propriedades mecânicas”, diz Azevedo. “Como a carbonatação consome espécies alcalinas, há redução progressiva do pH, o que favorece a durabilidade, especialmente com fibras vegetais.”
Os testes indicam que o cimento pode capturar até 100 quilos de dióxido de carbono por metro cúbico. “A próxima etapa é aumentar a taxa de captura e mineralização do dióxido de carbono por meio da alteração das reações químicas iniciais do cimento magnesiano”, afirma. “O material será exposto a uma atmosfera rica em dióxido de carbono para estudar a formação de carbonatos de magnésio e aprimorar o desempenho técnico e ambiental.”
Azevedo destaca que, por se tratar de uma tecnologia diferente da convencional, será preciso adaptar etapas do processo industrial para viabilizar sua aplicação em larga escala. “Além da produção em escala piloto, o projeto prevê um estudo técnico-econômico sobre a viabilidade de uso do dióxido de carbono gerado nas usinas para a carbonatação do cimento”, afirma. “Nosso objetivo é não apenas melhorar o desempenho do material, mas também promover um modelo de negócio mais sustentável e com menor emissão de carbono.”
O estudo conta com a participação do professor Holmer Savastano Junior, da FZEA, e da professora Cise Unluer, da Universidade de Manchester (Reino Unido), com apoio da Fapesp.
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